Leonardo regressa a Milão | M5

La Belle Ferronière, Leonardo da Vinci, 1490-1496MUSEU DO LOUVRE
A primeira retrospectiva que Itália dedica ao mestre do Renascimento desde 1939 fica aberta até 19 de Julho.
Está a ser apresentada como a mais ambiciosa das exposições que Itália já dedicou a Leonardo da Vinci, e como a primeira retrospectiva desde 1939, o ano da guerra. Leonardo 1452-1519. O desenho do mundo reúne até 19 de Julho no Palácio Real de Milão um conjunto impressionante de pinturas, desenhos e manuscritos do mestre da Renascença, mas também trabalhos de artistas seus contemporâneos que ajudam a traçar o percurso deste homem que se dedicou como poucos à arte e à ciência, revolucionando-as.
Engenheiro, cientista, escultor, cenógrafo e pintor prodigioso, Leonardo da Vinci encontra nesta exposição um retrato da sua trajectória multifacetada, garante o diário italiano La Repubblica. Dividida em 12 núcleos temáticos, uns dedicados à actividade científica, centrando-se na astronomia, na anatomia ou nas suas invenções, outros ao domínio das artes, Leonardo 1452-1519 propõe ainda módulos de cruzamento com referentes mais genéricos e, por isso, mais abrangentes, com títulos como Realidade e Utopia, O Sonho ou A Unidade do Conhecimento. A fechar, como se os núcleos anteriores não fossem já disso reflexo, uma secção dedicada à “criação do mito” Leonardo.

Estudo para Virgem e o Menino com um Gato, Leonardo da Vinci, c.1478-1480 DEAGOSTINI PICTURE LIBRARY/SCALA, FLORENÇA
A Mona Lisa do Museu do Louvre, em Paris, não está entre as centenas de obras que podem ser vistas nos próximos meses em Milão, nem A Anunciação das Galerias dos Uffizi de Florença, mas a exposição do Palácio Real promete não desapontar
A Mona Lisa do Museu do Louvre, em Paris, não está entre as centenas de obras que podem ser vistas nos próximos meses em Milão, nem A Anunciação das Galerias dos Uffizi de Florença, mas a exposição do Palácio Real promete não desapontar, tendo reunido importantes obras de Leonardo, como São João Baptista (1513-1516, Louvre), La Belle Ferronnière (1493-95, Louvre), Homem de Vitrúvio (c. 1490, Galeria da Academia de Veneza), Madonna Dreyfus (1475-1480, National Gallery de Washington) e São Jerónimo (1480, Museus do Vaticano), mostradas ao lado de trabalhos de artistas que o influenciaram ou que eram seus contemporâneos, como Sandro Botticelli, Lorenzo di Credi, Filippino Lippi, Antonello da Messina, Andrea del Verrocchio, Della Robbia, Jan van Eyck, Domenico Ghirlandaio ou o arquitecto Donato Bramante.
Pintura, desenho (são mostrados cem, 30 dos quais da colecção real britânica), esboços, códigos, tratados e outros manuscritos do mestre encontram, assim, o seu contexto dentro e fora de Itália, permitindo ao visitante estabelecer comparações directas entre a sua produção e a de outros artistas, algo que, espera o comissário Pietro Marani, torne a exposição mais acessível a um público não-especializado.
São Jerónimo, Leonardo da Vinci, c.1482MUSEUS DO VATICANO
As exposições retrospectivas do mestre da Renascença são raras, lembrou a também comissária da exposição Maria Teresa Fiorio à publicação especializada The Art Newspaper, porque a sua pintura, feita sobre madeira, é muito frágil, o que levanta grandes preocupações quanto à conservação das obras em viagem. E, se, por um lado, se torna quase impossível garantir o empréstimo por parte dos grandes museus que têm pinturas e desenhos de Leonardo nos acervos, por outro há que ter em conta a “armadilha” que o seu universo de criação representa para curadores e directores de instituições culturais: “É muito difícil lidar com a produção artística e intelectual de Leonardo sem cair em generalizações ou em ‘exposições-espectáculo’ centradas num só trabalho”, acrescentou ainda esta historiadora de arte especializada na renascença italiana.

Studies of scytched chariots,Leonardo da Vinci DEAGOSTINI PICTURE LIBRARY/SCALA, FLORENÇA
“Estamos habituados a ver Leonardo como um génio percursor, mas esta é uma visão um pouco oitocentista […]. O que encontramos nesta exposição é um Leonardo que dá valor ao que lhe chega e o transforma”, defende Marani.

A mostra de Milão, uma espécie de tributo da cidade ao mestre que ali viveu quando trabalhava para o duque Ludovico Sforza, criando obras de arte e transformando o tecido urbano, tem agora a difícil tarefa de competir com a memória que deixou a exposição da National Gallery de Londres (2011) e que se chamava, precisamente, Leonardo da Vinci: Painter at the Court of Milan.